terça-feira, 19 de julho de 2011

"Pobre Flynn, quem foi que te deixou na chuva?"*

* O Piano.

Este é um não-diálogo: 
'E's not pinin'! 'E's passed on! This dialogue is no more! He has ceased to be! 'E's expired and gone to meet 'is maker!
'E's a stiff! Bereft of life, 'e rests in peace! If you hadn't nailed 'im to the perch 'e'd be pushing up the daisies!
'Is metabolic processes are now 'istory! 'E's off the twig!
'E's kicked the bucket, 'e's shuffled off 'is mortal coil, run down the curtain and joined the bleedin' choir invisibile!!
This is an ex-dialogue (adaptação de: Dead Parrot sketch - Monty Phyton).

- Deixa eu te explicar, por favor!
- Não.
- Não?
- Tá tudo bem.
- Lá vem você com esse “tá tudo bem” como se não houvesse sentimento dentro de você.
- O que você quer eu faça?
- Me escute!
- Não.
- Mas eu quero.
- Ok.
- Não é como você está pensando, eu não fiz...
- ...
- Tá me ouvindo? O que você está fazendo?
- Me olhando no espelho.
- Sua velha mania de tentar enxergar seu interior através de um espelho.
- Para você ver.
- Você tem um muro na frente, ninguém sabe o que você sente, como sente e na intensidade que sente! É impossível lidar com você, mas ao mesmo tempo...
- Talvez seja por isso que não dê certo, você é imediato e eu sou construção. Logo, tá tudo bem.
- Não, não está! A vida continua, você mesma diz isso, que as coisas mudam e que é necessário humildade para ver essa mudança acontecer vagarosamente, mas sempre dando um empurrãozinho para que haja algum movimento para frente, não se pode ficar parado.
- Bom saber que você aprendeu isso.
- Seu coração nunca foi inteiro meu.
- Lá vem você com esse gráfico cardíaco.
- É sério, é visível, é palpável.
- Todo mundo tem algum tipo de cicatriz, principalmente interna. Vivemos com elas e nem lembramos que elas estão lá, até que o tempo muda e elas coçam, depois param, e voltamos a esquecer. Simples assim. Elas fazem parte de mim, e eu não sei porque te incomodam tanto.
- Sinceramente, foge total à minha compreensão sua linha de raciocínio.
- Me esquece.
- Como assim?
- Assim.
- Você consegue alternar uma alegria contagiante com uma melancolia avassaladora, parece que são duas pessoas, isso é estranho para mim. Além de se esconder atrás de livros, fones de ouvido e óculos de armação gigante.
- Eu chamo essa alternância de gente.
- Gente?
- Você tá sempre perguntando e se explicando, que coisa engraçada e desgastante.
- Engraçada?
- ...É... Acredito que dessa vez não vão ficar marcas de nenhum tipo...
- Hã? Oi? Tá ai??
- ...

Jane Campion entende de mulher como ninguém, principalmente as com modo operacional dito estranho:





Um comentário:

VW Nonno disse...

Bel, esse texto é fantástico. Junto com o das 6 da manhã mostra vc dominando o diálogo de forma viva e surpreendente e dolorosa. Achievement. Quanto a Jane Campion, sim, é extraordinária. Uma Louise Bourgeois do cinema. Fico louca com a sofisticação intelectual dela, sua capacidade de juntar elementos e tocar nas feridas. O piano tem como pano de fundo as irmãs Bronte, Um anjo é Janet Frame. Quisera ter, um minuto, tanta clareza e capacidade de síntese. Invista nos diálogos!
Eles podem ir direto para a Autobiografia Íntima!