quarta-feira, 23 de março de 2011

" O fim do mundo, não é nenhum fim do mundo, e se for? Descanse em paz" *

Hoje completo um mês longe do site mais popular dos últimos tempos.  Me recordo bem da madrugada portenha, em que, num acesso de raiva, decidi me matar definitivamente. Não era a primeira vez que isso acontecia, acho que tenho no currículo uns 3 suicídios facebookianos. Porém, naquela noite fatídica, todo aquele universo simplesmente não fez mais sentido, aquelas pessoas não fizeram mais sentido como um todo, aquela curtição toda me soou de uma maldade profunda. Na hora eu mesma achei que seria temporário, mas olha, que incrível, um mês já se passou.
Criei meu perfil em abril de 2007, me lembro de ter somente amigos que moravam fora naquelas páginas alvas, de higiene profunda, ainda mais quando comparadas ao Orkut, que ainda estava em vigência na época. Lá era tão desértico que conversava com uma amiga de São Francisco pelo mural, coisa que nunca fiz depois. Tinha também vários aplicativos interessantes de música, artes e livros, que com a oficialização da finalidade de ser um site de relacionamentos acabaram perdendo sua função de entreter. Era um espaço a priori bem legal, tanto que falava para todos os meus amigos íntimos migrarem para lá, afinal, era vazio e tinha que ser povoado. O que eu mais ouvia era: é muito complicado.
Descobri o Facebook por conta da revista Glamour UK, que na época eu assinava. A revista de comportamento feminino inglês (não beba, não fume, desça do scarpin, emagreça, cuidado com o sexo casual) dizia que era um belo lugar para se conhecer gente. Criei minha conta na ânsia de fazer pen friends versão 2.0. Em meados de 2009 ocorreu o boom, e não mais que de repente todo mundo estava lá. Diferente do falecido e querido Orkut, todo mundo mesmo estava lá. E essa massa de gente conectada dava opiniões, colocava música, vídeos, fotos, frases de outras pessoas e autores, jogos idiotas... era tanta informação alheia que apelidei o site de Cortiçobook. Ali só não  sabia da vida do outro quem fazia um esforço tremendo para não querer saber. Paraíso dos stalkers,  fonte de paranoia, maná do ciúme e da histeria coletiva, o Facebook trazia à tona, em um simples passar de olhos, conflitos internos mil. Eu enquanto perfil, sendo apenas mais um entre tantos, abraçava minha missão de me preservar e fuçar tudo que era jogado na minha página inicial, ou, até mesmo, ir à cata de subsídios, para que quebra-cabeças comportamentais complexos se formassem na minha cabeça. Confesso que nunca tive sanidade mental e distanciamento necessário para lidar com aquele espaço, de alguma forma ele me fascinava e perturbava.
Um dia, no entanto, você para e vê que também é peça fundamental de quebra- cabeças alheios, e essa sensação nem é das melhores. Quando esse dia chega, a sensação de certo “fracasso” que dá quando postamos algo e ninguém curte se torna revigorante: “que bom que ninguém tá nem aí pra mim. Ufa! Passei despercebida. Eu nem sou tão interessante, engraçada, inteligente, sarcástica, culta e amiga assim... Sou gente, e das bem mundaninhas”. Todavia, como está escrito no Gênesis, comer do fruto nunca é fácil para ninguém, e suas conseqüências reverberam na nossa rotina: “no dia em que dele comerdes se abrirão os vossos olhos ”. Ao não se preocupar mais com que acontece ali, uma maneira de olhar diferente aquele espaço aparece, mostrando que, se você não é tão interessante, pior, seus amigos queridos podem ser uns idiotas completos de opiniões vazias e gosto duvidoso. Coisas que no convívio real não se destacam, não são dignas de nota, ali, de alguma forma, ficam muito evidenciadas.
Há um mês do meu sepultamento, seria falso dizer que não senti certa falta e que não assombrei por aquelas bandas. Como o Facebook permite que você ressurja das cinzas, já estive lá por alguns minutos recolhendo pertences e pedaços de informações, e volta e meia pergunto para os amigos: "O que tem acontecido no Facebook?" (respeito e entendo muito quem curte estar lá). Só que dessa vez, diferente das outras mortes, não me sinto mais pertencente àquele lugar, e, sinceramente, como já disse, não sinto uma falta louca, no máximo uma faltinha. Constato até, que ao sair de lá, meu tempo é mais bem aproveitado e fiquei um pouco mais interessante. Sinto uma certa liberdade em não ter que me manifestar em um curto espaço, e não ter uma aprovação imediata. Ando pesquisando as coisas por minha conta, ainda vejo o twitter, apesar de não twittar, ando investindo e reestruturando este blog, que acabou sendo meu maior contato com o mundo digital, e que carrega muito mais coisas minhas que qualquer rede social. Neste espaço customizado, existe a preocupação de se pensar minimamente antes de publicar, e, ao mesmo tempo, a opinião dos outros não é fundamental, já que o número de leitores é mais reduzido que 584 amigos – número máximo atingido.  Aqui, no meu e-mail, por telefone (que eu odeio), e principalmente na minha vida real, sou mais genuína e divertida do que em todo meu tempo de Facebook, quando a brincadeira de esconde-esconde de informação e emoção me esgotava. Infelizmente, não posso afirmar que ficarei 100% longe do espaço azul por questões de trabalho: ele ainda é uma ferramenta muito importante. E muito menos vou dizer que se surgir outra coisa eu não vá aderir à moda, claro que vou. Gostaria até, que houvesse um  retorno do Orkut, que era bem mais engraçado com suas comunidades, gelinhos, testemunhos e corações. Passada a crise de abstinência, acho que estes últimos 30 dias foram mais sinceros, mais reais, e acima de tudo, mais vividos do que os meses anteriores.

O texto da escritora inglesa Zadie Smith, que saiu na revista Piauí em fevereiro,  chancelou a crise. A parte de maior destaque para mim foi o fato dela alertar que o Facebook surgiu pelo sentimento mais coninha do ser humano – vingança. Deixo aqui, um trecho e o link para a matéria inteira:

"Quando uma pessoa se transforma numa série de dados num website como o Facebook, tudo nela fica menor: a personalidade individual, as amizades, a linguagem, a sensibilidade. De certo modo, não deixa de ser uma forma de transcendência: perdemos nosso corpo, nossos sentimentos contraditórios, nossos desejos, nossos medos – o que me faz pensar que aqueles de nós que sempre recusaram, com repulsa, o que vemos como uma ideia burguesa hiperinflada da identidade individual talvez tenham exagerado no sentido inverso: as identidades despojadas que assumimos na rede não mostram mais liberdade. São, apenas, mais controladas por alguém."


O filme corroborador da decisão tomada:







* Trecho da música Decadance avec elegance - Lobão.

3 comentários:

VW Nonno disse...

O FB ficou menos alegre sem vc, e garanto que não sou a única a sentir.
Vc pode não ter 500 e poucos amigos, mas certamente tem bem mais de 4 que gostam de acompanhar o turbilhão de sua mente.

Dissolvida disse...

muito bom esse vídeo!
eu sinto falta de você no facebook, eu sou um dos 4 ou bem mais que 4, como disse a vivian e eu concordo com ela, que amava acompanhar "o turbilhão de sua mente". o facebook definitivamente ficou muuuuito mais triste sem você!

Eugenia Ribas Vieira disse...

rrBel,

maravilhoso o texto. Quase sai do meu depois de lê-lo.

Eugenia.