Da imensidão indefinida chega um nevoeiro, uma cor violeta já encontrada no caminho de outros lugares, de outros rios, nas monções muito distantes da chuva.
A mão do homem se ergue, desce e começa a esbofetear. Primeiro docemente depois secamente.
A mão esbofeteia a comissura dos lábios depois, cada vez mais forte, esbofeteia os dentes. Ela diz que sim, que é isso. Ela levanta o rosto para melhor oferecê-lo aos golpes, ela o torna mais relaxado, mais à disposição da mão dele, mais material.
Ao fim de uns dez minutos, eles se teriam instalado juntos numa precisão paralela. Ele bate cada vez mais forte.
A mão desce, golpeia os seios, o corpo. Ela diz que sim, que é isso, sim. Seus olhos choram. A mão bate, golpeia, cada vez mais firme, a ponto de atingir uma velocidade maquinal.
O rosto está esvaziado de qualquer expressão, aturdido, já não resiste a nada, mole move-se à vontade em torno do pescoço como coisa morta.
Vejo que assim também o corpo se deixa espancar, que está abandonado, alheio a toda dor.
Que o homem xinga e bate. E depois de repente os gritos, o medo.
E depois vejo que essas pessoas foram submersas pelo silêncio.
Vejo que chega a cor violeta, que ela atinge a embocadura do rio, que o céu está encoberto, que ele estancou no seu lento percurso rumo à imensidão. Vejo que outras pessoas olham, outras mulheres, que outras mulheres agora mortas olharam assim também se comporem e se decomporem as monções de verão diante de rios margeados por arrozais escuros, em face de embocaduras vastas e profundas. Vejo que da cor violeta chega uma tempestade de verão.
Vejo que o homem chora deitado sobre a mulher. Dela não vejo nada além da imobilidade. Eu desconheço, eu não sei nada, eu não sei se ela dorme.
Marguerite Duras - O homem sentado no corredor.
A cor violeta externalizada - Foto de: Beaute Sauvage
4 comentários:
terrível o roxo, em todos os sentidos. Tive ânsias de Reparil Gel.
UFC...
Me apaixonei pelo Anderson Silva ♥
Achei que era uma homenagem a Maria da Penha.
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