quarta-feira, 8 de junho de 2011

“Amar alguém e se lambuzar”

Ainda em relação ao último post, e todo o meu discurso hippie chato, que me acompanha desde que percebi que nunca tive um microondas em casa, ou seja: é genético.

Curtir é covardia - Jonathan Franzen*

 
Duas semanas atrás, substituí meu BlackBerry Pearl, já com três anos de idade, por um BlackBerry Bold, muito mais poderoso. Nem preciso dizer como fiquei impressionado com o quanto a tecnologia avançou em três anos. Mesmo quando não havia ninguém para telefonar ou mandar e-mail, eu queria continuar mexendo no meu novo Bold e sentir a maravilhosa nitidez de sua tela, a movimentação sedosa do seu trackpad, sua chocante velocidade de resposta, a sedutora elegância de seus gráficos.
Em resumo, fiquei apaixonado por meu novo dispositivo. É claro que o dispositivo anterior também tinha despertado em mim uma paixão semelhante; mas, com o passar dos anos, nosso relacionamento perdeu brilho. Surgiu uma série de problemas na minha relação com o Pearl: problemas de confiança, de responsabilidade, de compatibilidade e até, na porção final de nossa história conjunta, algumas dúvidas em relação à própria sanidade do meu Pearl, até que finalmente vi-me obrigado a reconhecer que eu tinha amadurecido e perdido o interesse naquele relacionamento.
Será que preciso destacar o quanto nosso relacionamento era – na ausência de uma extravagante e antropomorfizante projeção segundo a qual meu antigo BlackBerry teria ficado magoado com o esmaecimento do amor que eu sentia por ele – absolutamente unilateral? Permita-me destacá-lo mesmo assim.
(...) Permita-me propor a ideia de que, conforme nossos mercados descobrem e respondem àquilo que os consumidores mais desejam, nossa tecnologia se torna extremamente hábil na criação de produtos que correspondam ao nosso ideal fantasioso de um relacionamento erótico, no qual o objeto amado se entrega por completo sem exigir nada em troca, instantaneamente, fazendo que nos sintamos todo-poderosos, sem criar cenas constrangedoras quando é substituído por um objeto ainda mais sexy, sendo então relegado a uma gaveta.
Falando numa perspectiva mais geral, o objetivo definitivo da tecnologia, a teleologia da techné, é substituir um mundo natural indiferente a nossos desejos – um mundo de furacões e dificuldades e corações partíveis, um mundo de resistência – por outro mundo que responda tão bem a nossos desejos a ponto de ser, com efeito, uma mera extensão do ser. Permita-me sugerir, finalmente, que o mundo do tecnoconsumismo é, portanto, incomodado pelo amor verdadeiro, restando-lhe como única escolha responder perturbando o amor....
 Como o texto é grande, deixo aqui o link para continuar lendo:  http://blogs.estadao.com.br/link/curtir-e-covardia/

Porém, vou colocar o final que achei bacana.

Exatamente aquilo que o amor faz com uma pessoa. Pois a questão fundamental envolvendo a todos nós é o fato de que vivemos por algum tempo, mas morreremos em breve. Esse fato é a verdadeira causa fundamental de toda a nossa raiva, dor e desespero. E a pessoa pode optar por fugir desse fato ou, por meio do amor, aprender a aceitá-lo. Quando ficamos em nossos quartos e bufamos ou caçoamos ou damos de ombros indiferentemente, como eu fiz durante tantos anos, o mundo e seus problemas parecem impossivelmente desafiadores. Mas, quando saímos e nos colocamos em relacionamentos reais com seres reais, ou mesmo animais reais, há o perigo bastante real de amarmos alguns deles.
E quem pode prever que rumo a vida tomará então?

* Tradução de Augusto Calil para Redação Link do jornal Estadão.* *  Autor de Liberdade, (Cia das Letras), Frazen escreveu este ensaio a partir de um discurso de abertura feito por ele no dia 21 de maio em Kenyon College.

Um comentário:

VW Nonno disse...

texto muiittooo legal.