segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Já é primavera

Eu nem acho pepinos tão saborosos assim, todavia, é uma das minhas palavras favoritas em inglês: Cucumber - uma coisa biquinho refrescante gosmento.

Quanto mais ruídos advêm da boca mastigadora dos mortais, mais próximos nos colocamos dos porcos e de outros seres amigos do chão. Prefiro testemunhar graves e degenerescentes enfermidades a escutar as manifestações detestáveis que a mais maliciosa cavidade do corpo humano propaga quando está a trabalho, nhac, nhac, nhac.

Edificar cidades e escrever legislação são inequívocas comprovações de nossa boa educação, mas civilizar inclui o iso comedido e reservado dos caninos. Pães, carnes e ovos macerados compõem uma repugnante opereta de refeitório, amplificada pelas bochechas.

Não se conhece o perigo de um pepino até ouvir sua trituração. Não se sabe de sua sordidez até constatar que a água nele contida,  liberada na boca após a ação desmedida da gla, ajudará na liquefação da pasta encardida de verde que descerá pelo esôfago.

Devemos, no entanto, constatar que, mesmo vil, o pepino é apenas um pequeno componente de uma cena desgraçada, inevitável e cotidiana. O verdadeiro inimigo reconhece-se pela extensão da mandíbula, pela distância que mantém da mesa e pela empunhadura do garfo. Não posso ouvir, com indiferença e calma a formação do bolo alimentar promovida por duas mulheres às voltas com um cadáver insepulto.

A passagem tensa dos corpos - Carlos Brito e Mello.


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